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Da cadeia, 'chefão do tráfico' conseguiu empréstimo bancário milionário
Banco liberou R$ 1 milhão para os irmãos Martins. Um estava preso e o outro, foragido da Justiça. Terreno dado como garantia estava sequestrado pela Justiça
Correio do Estado / Neri Kaspary
Apontados como donos de um patrimônio estimado em R$ 100 milhões supostamente procedente do tráfico de cocaína, os irmãos Marcel Martins Silva e Valter Ulisses Martins Silva conseguiram um empréstimo bancário de R$ 1 milhão mesmo após terem sido alvos de uma megaoperação da Polícia Federal. Na data da concessão do empréstimo, o primeiro estava na cadeia e o outro, foragido da Justiça.
Marcel Martins foi preso em 15 de maio do ano passado e colocado em liberdade em julho deste ano. Seu irmão conseguiu escapar do cerco policial naquela data.
Mesmo assim, em 16 de dezembro do ano passado uma agência do Sicoob de Dourados liberou um empréstimo de R$ 1 milhão para uma empresa registrada em nome de Valter, a Paris Construtora & Transportadora, e para seu se irmão Marcel e a esposa dele.
Apesar da repercussão que a operação da PF havia provocado envolvendo os imãos, o banco aceitou omo garantia um terreno no luxuoso condomínio “Hectares Park & Resort”, em Dourados.
As informações sobre esta negociação vieram a público por meio do diário oficial do Governo do Estado desta segunda-feira (01). Um edital divulgado nas páginas 147 e 148 informa que um terreno de 944 metros quadrados, avaliado em R$ 1,2 milhão, no luxuoso condomínio está sendo leiloado a partir desta terça-feira (2) para quitação de uma dívida de R$ 1 milhão com a cooperativa de crédito Sicoob.
De acordo com o edital, o terreno, registrado em nome da Paris Construtora e Transportadora, está indo a leilão para o pagamento desta dívida de R$ 1 milhão, contraída em 16 de dezembro do ano passado, quando o imóvel foi colocado como garantia.
Os lances, com valor mínimo de R$ 1,2 milhão podem ser dados entre os dia 2 e 9 de setembro. Se não houver oferta, o certame segue até o dia 16, com redução de 100 mil reais.
O empréstimo foi concedido à empresa Paris Construtora & Transportadora, que está registrada em nome de Valter Ulisses Martins. Marcel Martins Silva e a sua a sua mulher, Evelyn Zobiole Marinelli Martins, também aparecem como beneficiários.
A mulher de Marcel também chegou a ser alvo das operações da Polícia Federal, em 15 de maio do ano passado, mas não ficou detida.
A divulgação do leilão apareceu no diário oficial porque tanto o proprietário da empresa (Valter Martins) quanto o casal foram procurados em três datas e endereços diferentes, mas ninguém foi localizado ao longo da segunda quinzena de agosto.
O terreno no condomínio de alto padrão e uma série de outros bens foram sequestrados pela Justiça em maio do ano passado, em meio à Operação Prime. A Justiça Federal comunicou ao cartório nos dias 15 e 20 de maio que o terreno havia sido sequestrado.
Mesmo assim, a cooperativa de crédito Sicoob aceitou como garantia o terreno com três restrições judiciais, conforme informa o edital do leilão. Além disso, conseguiu as assinaturas de um foragido da Justiça e de um preso para liberar o dinheiro.
Na época da operação, a Polícia Federal informou que em três anos ele acumulou patrimônio da ordem de R$ 100 milhões. E, conforme a PF, este patrimônio seria fruto da lavagem de dinheiro procedente da movimentação de R$ 300 milhões com o tráfico de cocaína.
ANULAÇÃO
Marcel Martins Silva chegou a ficar detido até meados de julho deste ano, mas acabou sendo liberado porque seus advogados conseguiram no Superior Tribunal de Justiça (STJ) uma decisão dizendo que as provas utilizadas pelo Polícia Federal que levaram à decretação de sua prisão eram ilegais.
Mas, apesar da anulação das provas e da liberação da maior parte dos envolvidos, a Justiça Federal manteve o bloqueio dos bens e das contas bancárias e é exatamente por isso que o terreno está sendo levado a leilão. Como o imóvel foi sequestrado pela Justiça antes de ele ser aceito como garantia pela cooperativa de crédito, possivelmente a tendência é de que não haja comprador, já que ele continua indisponível.
Marcel e Valter chegaram a ter o julgamento agendado para março deste ano. Porém, por conta da decisão do STJ, tudo voltou à fase do inquérito policial e até agora a Polícia Federal não divulgou se apresentou nova denúncia à Justiça sobre o suposto envolvimento dos irmãos com o narcotráfico.
ASSASSINATO
E por conta de seu suposto envolvimento com o narcotráfico. Os irmãos também são investigados por assassinato. A investigação da Polícia Federal identificou que os irmãos Marcel e Valter seriam os mandantes do assassinato de Líder Ramón Ruiz Díaz Recalde, de 29 anos, executado em agosto de 2022, na cidade de Arroyito, localizado no departamento paraguaio de Concepción, próximo a Pedro Juan Caballero, na fronteira com MS.
De acordo com dados obtidos através da quebra de sigilo telemático dos irmãos Martins, durante a Operação Prime, em conversa com Mario David Distefano Freitas, Valter Martins teria pedido para ele “liquidar” o desafeto.
“De forma mais explícita, consta no serviço de nuvem de Mario o seguinte print de troca de mensagens com o contato Valter Ulisses, que determina que seja feita a liquidación de Ramon”, diz trecho da investigação da PF.
O funcionário, dito como braço direito dos irmãos respondeu: “OK”. Ao que Valter seguiu: “O mais rápido possível ok! Faz a liquidación, mas nem fala pro Marcel”.
Na investigação, a Polícia Federal não detalha qual seria o motivo da morte, mas segundo informações obtidas pelos agentes, Líder Ramón seria ex-funcionário dos irmãos Martins.